Numa década, o salário médio dos portugueses apenas aumentou para os menos qualificados

O Estado da Nação: Educação, Emprego e Competências em Portugal é um relatório anual da Fundação José Neves que pretende promover a discussão pública das debilidades e oportunidades da educação e do sistema de desenvolvimento de competências em Portugal. Um dos objetivos do Estado da Nação é descobrir e disseminar conhecimento sobre o ponto de situação da educação, do emprego e das competências em Portugal, apresentando metas aspiracionais para 2040.  

O relatório Estado da Nação 2022 está disponível para consulta a partir das 00h00m de 21 de junho de 2022.

Abaixo seguem as principais conclusões da edição 2022 do relatório, que este ano será divulgado publicamente no evento anual da Fundação José Neves no dia 21 de junho.

Salários dos portugueses com o ensino superior caíram 11% na última década

Os trabalhadores com o ensino superior e com o secundário registaram, em média, perdas reais nos salários de 11% e de 3% respetivamente na última década.

Para os mais jovens a situação foi semelhante, com quedas do salário ainda mais acentuadas no ensino superior (-15% entre os licenciados, -12% entre os mestres e -22% entre os doutorados).

Entre 2011 e 2019 o salário médio dos portugueses aumentou apenas para os trabalhadores com o ensino básico, na ordem dos 5%, muito por força do aumento do salário mínimo por decreto-lei e por via da negociação coletiva.

Mais educação continua a garantir salários mais elevados, mas o diferencial tem diminuído

Apesar do salário médio em 2019 ser menor do que o de 2011 na maioria dos níveis de escolaridade, os ganhos salariais dos portugueses mais qualificados face aos menos qualificados são consideráveis. Em 2019 uma licenciatura resultava, em média, num ganho salarial de 50% face ao ensino secundário. Já com o mestrado esse ganho ascende aos 59%. Os prémios salariais também se verificam nos jovens adultos (dos 25 aos 34 anos) e são os mestrados que conferem um retorno salarial superior, com ganhos de 43% face ao ensino secundário e de 15% face às licenciaturas.

Um nível superior de educação aumenta a probabilidade de estar empregado e de chegar aos dois níveis mais elevados de rendimento. Face a quem tem no máximo o ensino secundário, os que têm o ensino superior têm uma probabilidade 16% superior de estarem empregados e 50% superior de estarem entre os 40% da população com maior rendimento. Os mesmos valores para a comparação entre ensino secundário e ensino básico são 10% e 29% respetivamente.

Portugal é um dos países da UE com os rendimentos mais baixos

Em 2020, o rendimento anual médio líquido (em paridade de poder de compra) em Portugal era de 14.691€, o 8º mais baixo da União Europeia. Os portugueses com o ensino básico e secundário tinham um rendimento médio de 11.441€ e 14.216€ respetivamente (o 10º mais baixo entre os 27 países membros). Já com o ensino superior o rendimento médio não ultrapassava os 20.476€ (o 9º mais baixo na UE).

Em 2020 o rendimento médio dos trabalhadores portugueses com educação superior era menor do que o dos trabalhadores com o ensino secundário em 12 países da UE (Itália, Irlanda, Finlândia, França, Malta, Bélgica, Holanda, Suécia, Dinamarca, Alemanha, Áustria, Luxemburgo) e do que os trabalhadores menos qualificados em 4 países da UE (Finlândia, Holanda, Dinamarca e Luxemburgo).  

Produtividade é cada vez menor face à média europeia

Há uma associação positiva entre salários e produtividade dos países e apenas um aumento sustentado da produtividade dará margem para aumentos salariais. A produtividade em Portugal tem perdido terreno face à média da União Europeia e nem o aumento das qualificações das gerações mais jovens inverteu essa tendência. Portugal está entre o grupo de países da UE com a produtividade mais baixa. Em 2019 era o 6º país com menor produtividade, apenas acima de países como a Roménia, Polónia, Letónia, Grécia e Bulgária. Desde 2000, a produtividade portuguesa nunca ultrapassou os 70% da média europeia, valor atingido entre 2006 e 2010 e em 2013. Em 2019, antes do início da crise pandémica, a produtividade dos portugueses era equivalente a 66% dos trabalhadores da UE.

São vários os fatores relacionados com as qualificações que contribuem para a produtividade. Empresas com uma força de trabalho mais qualificadas são mais produtivas, mas o ajustamento entre qualificações e profissões também é essencial.

Além das qualificações de base, a aposta das empresas na formação dos seus trabalhadores também pode aumentar a produtividade em 5%, mas apenas 16% das empresas portuguesas o faz.

Os jovens estão cada vez mais qualificados, mas as qualificações dos trabalhadores com menos de 35 anos apenas contribuem para ganhos de produtividade quando os jovens têm um peso superior a 40% no total de trabalhadores das empresas. Se os jovens representarem entre 10% e 40% não há melhorias na produtividade e se forem menos de 10% o efeito na produtividade pode ser negativo.

As qualificações dos gestores pesam praticamente tanto para a produtividade como as dos trabalhadores, mas apesar de terem vindo a aumentar, Portugal continua a ter a maior percentagem de empregadores que não terminou o ensino secundário. Em 2021, este era o caso para 47,5% dos empregadores, praticamente o triplo da média europeia que se fixou em 16,4%.

Covid-19: entrada dos jovens no mercado de trabalho ficou mais difícil e perdas na aprendizagem podem ser irreversíveis

Durante a pandemia, o emprego dos jovens foi o mais afetado e ainda não tinha recuperado totalmente no último trimestre de 2021, com perdas de 27.500 empregos face ao mesmo trimestre de 2019.

Além do impacto nos jovens já no mercado de trabalho, a crise sanitária dificultou a entrada dos jovens no mercado de trabalho.

Em 2021, apenas 74% dos jovens entre os 20 e os 34 anos que tinham completado um nível de escolaridade nos últimos 3 anos estavam empregados, uma queda acentuada face a 2019 que interrompe a tendência positiva que se vinha a verificar desde 2012. A queda foi mais acentuada entre os que terminaram um curso superior, apesar da taxa de emprego destes recém-diplomados continuar acima dos que terminaram o ensino secundário.

Para além de penalizar a entrada no mercado de trabalho dos jovens, a pandemia teve implicações na aquisição e no reforço de competências em diferentes fases da vida, comprometendo o futuro profissional de indivíduos e trabalhadores e também o crescimento económico do país. O ensino à distância levou a perdas de aprendizagem e foi um indutor de desigualdades sociais nomeadamente entre o ensino público e o ensino privado. O acesso ao ensino superior bateu recordes durante a pandemia, mas também aumentou a taxa de abandono e não há evidências do efeito sobre as aprendizagens e competências destes alunos.

Metas propostas pela Fundação José Neves para 2040

A educação e a produtividade são dois desígnios críticos para Portugal que estão interligados. É fundamental aumentar a produtividade de forma a melhorar os salários, aumentar o ganho salarial associado a mais educação, assegurar que há incentivos à educação e garantir um futuro mais próspero para Portugal e para os portugueses.

É necessário garantir o aproveitamento ótimo das qualificações existentes, continuar a apostar nas qualificações dos mais jovens, na requalificação dos adultos com baixa escolaridade e que o mercado acompanhe o esforço de qualificações das gerações mais jovens.

A Fundação José Neves ambiciona para 2040:

Portugal nos 10 países da UE com mais emprego em tecnologia e conhecimento (de 2019 para 2021 passou de 19º para 16º);

Pelo menos 25% dos adultos devem participar em educação e formação ao longo da vida (atualmente está nos 13%);

Máximo de 15% dos adultos (25 aos 64 anos) com baixa escolaridade (atualmente está nos 40,5%);

Pelo menos 60% dos jovens adultos com o ensino superior (atualmente está nos 47,5%).

Pelo menos 90% dos jovens recém-formados com emprego (em 2021, apenas 74,2% dos jovens entre os 20 e os 34 anos que tinham completado o ensino secundário ou superior nos últimos 3 anos estavam empregados).

“O Estado da Nação pretende promover a discussão pública sobre as debilidades e oportunidades do sistema de desenvolvimento de competências e fazer um ponto de situação da educação, do emprego e das competências em Portugal. É um forte contributo à sociedade em geral e aos agentes relacionados com a educação em Portugal, em particular o Estado, as instituições de ensino e as empresas, para que estes possam tomar as melhores decisões para o desenvolvimento do país e dos portugueses”, destaca José Neves.

Carlos Oliveira, Presidente Executivo da FJN, sublinha que “os dados científicos que constam no Estado da Nação 2022 permitem uma análise profunda do alinhamento entre o emprego, a educação e as competências em Portugal, perceber onde estamos no panorama europeu e para onde devemos caminhar, e o papel fundamental da educação e da formação orientada para as necessidades do mercado de trabalho para estancar de vez o fosso da produtividade nacional face à média europeia, no qual os jovens qualificados podem ter um papel fundamental. O aumento da produtividade é fundamental para elevar os salários e as condições de vida dos portugueses.”

Estado da Nação 2022 sobre Educação, Emprego e Competências em Portugal

Depois da retrospetiva das principais dinâmicas na educação, emprego e competências durante a última década feita na Edição de 2021, o Estado da Nação 2022 atualiza as tendências após dois anos de pandemia e foca-se em temas estruturais e centrais como o retorno financeiro da educação e a relação entre educação e produtividade. Aponta ainda para um novo paradigma para o mercado de trabalho, assente em competências em vez de profissões, apresentando e caracterizando clusters de profissões baseados em competências. Esta segunda edição conclui com um olhar para o futuro e com a atualização da posição atual face às metas de desempenho aspiracional para um Portugal do conhecimento em 2040.  

A edição 2022 do relatório será apresentada no evento anual da Fundação José Neves no dia 21 de junho, a partir das 15h, com transmissão em direto na plataforma digital da FJN e nas redes sociais da FJN (Youtube, Facebook e LinkedIn).

O evento conta com oradores como Alanis Morissette, António Damásio, Durão Barroso, António Horta Osório, Nataly Kogan e muitos outros, vai ser ainda  o palco para a apresentação das novidades sobre a plataforma Brighter Future e fazer um ponto de situação do programa de bolsas reembolsáveis ISA FJN e da aplicação de desenvolvimento pessoal, bem-estar e saúde mental 29k FJN.

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