Em 2020, a disparidade salarial entre géneros continuou a cair, mas os homens ainda ganham 19% mais do que as mulheres

A análise da evolução do salário médio ao longo dos últimos anos – de 2010 a 2019 – revela que os homens continuam a ganhar mais do que as mulheres, independentemente da idade, nível de qualificação ou da região do território português onde trabalhem. O maior crescimento do salário médio das mulheres face ao dos homens tem levado a uma diminuição desta diferença salarial entre géneros. Será que a pandemia inverteu a tendência verificada nos últimos anos?

Neste insight, analisa-se a evolução da disparidade salarial entre géneros no mercado de trabalho português, incluindo em 2020, tendo em consideração a idade dos trabalhadores, o nível de qualificações ou a região de Portugal onde trabalham. Para isso, recorre-se aos dados dos Quadros de Pessoal que resulta de um inquérito anual obrigatório a todas as empresas do setor privado e do setor empresarial do estado com pelo um trabalhador por conta de outrem e que está a cargo do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (GEP/MTSSS). Os dados mais recentes, que reportam a situação das empresas em 2020, são comparados aos de 2019, antes da crise pandémica, e aos de 2010, no sentido de perceber a existência de tendências de relevo na composição do mercado de trabalho português.

COMO TEM EVOLUÍDO O SALÁRIO MÉDIO DOS TRABALHADORES EM PORTUGAL?

Entre 2010 e 2019, o salário médio real dos trabalhadores cresceu apenas cerca de 0,6%, uma evolução que esconde duas tendências muito distintas: a queda de 5,4% entre 2010 e 2015 e a recuperação de 6,4% entre 2015 e 2019.

Em 2020, ano marcado pelo início da crise pandémica, o salário médio fixou-se em cerca de 1200€, mantendo a tendência de crescimento, com um aumento de 4,6% entre 2019 e 2020. De facto, esta foi a maior taxa de crescimento anual dos salários, sendo inclusivamente superior a variação registada entre 2018 e 2019 (3,1%). A razão do aumento do salário médio pode ser no entanto muito diferente nos dois períodos, evidente pela diferente evolução do número de trabalhadores.

A acentuada subida do salário médio de 2019 para 2020 pode não resultar de um aumento efetivo do salário dos trabalhadores, mas sim de um efeito estatístico resultante de uma recomposição do emprego. Este efeito é comum durante períodos recessivos em que os postos de trabalho eliminados são os mais frágeis, tipicamente com vínculos laborais precários, menos qualificações, menor experiência profissional e remunerações mais baixas, o que leva a um aumento do salário médio.

Evolução do salário médio real e das pessoas ao serviço entre 2010 e 2020

FONTE: QUADROS DE PESSOAL (GEP/MTSSS), FJN/BRIGHTER FUTURE.1

O CRESCIMENTO SALARIAL FOI SUPERIOR NAS MULHERES, INCLUSIVE NA PANDEMIA

Em 2019, o salário médio real dos trabalhadores foi pela primeira vez superior ao de 2010, em aproximadamente 0,6%, mas com diferenças entre géneros.

  • Para as mulheres o salário médio real aumentou 3,7% entre 2010 e 2019, depois de uma queda de 4,4% entre 2010 e 2015 e uma forte recuperação de 8,5% entre 2015 e 2019.
  • Já para os homens, o salário médio real em 2019 continuava abaixo do de 2010 (-0,9%), resultante da queda de 5,2% entre 2010 e 2015 e da menor recuperação entre 2015 e 2019 (4,6%).

Em 2020, ano marcado pelo início da pandemia, mais uma vez, o crescimento salarial foi superior entre as mulheres (5%) do que nos homens (4,2%). Tendo em conta a evolução do emprego entre homens e mulheres neste período, é possível que as razões para este aumento de salários entre homens e mulheres sejam diferentes. De facto, a queda do emprego em 2020 verificou-se sobretudo nas mulheres (-1,9% para as mulheres e -0,2% para os homens) e alguns dos setores que mais beneficiaram com a crise pandémica são maioritariamente compostos por homens.

Evolução do salário médio real dos trabalhadores por género entre 2010 e 2020

FONTE: QUADROS DE PESSOAL (GEP/MTSSS), FJN/BRIGHTER FUTURE.1

EM 2020, A DISPARIDADE SALARIAL ENTRE GÉNEROS DECRESCEU

Os homens continuam a ter salários mais elevados do que as mulheres: cerca de 1294€ e 1091€, respetivamente, em 2020. Mas a evolução do salário médio desde 2010 tem beneficiado mais as mulheres do que os homens: entre 2010 e 2020, o aumento do salário médio foi muito mais expressivo nas mulheres do que nos homens, 8,9% e 3,2%, respetivamente.

Esta evolução resulta numa diminuição da disparidade salarial entre géneros, quer em termos relativos quer absolutos. Em 2010, os homens ganhavam, em média, mais 25% do que as mulheres, o que correspondia a uma diferença de 251€. Em 2020, estes valores tinham caído para 19% e 203€, respetivamente.

Evolução da disparidade salarial entre homens e mulheres por faixa etária entre 2010 e 2020

FONTE: QUADROS DE PESSOAL (GEP/MTSSS), FJN/BRIGHTER FUTURE.2

A DISPARIDADE SALARIAL ENTRE HOMENS E MULHERES É MAIS ACENTUADA ENTRE OS TRABALHADORES MAIS VELHOS

Independentemente da faixa etária e do ano, as mulheres ganham, em média, sempre menos do que os homens. Apesar disso, a disparidade salarial de género tem vindo a decrescer consistentemente em todos os grupos etários e o ano de 2020 não foi exceção.

Foi entre os grupos etários mais velhos, onde existe maior disparidade salarial entre géneros, que o ganho salarial médio dos homens comparativamente às mulheres mais decresceu:

  1. Na faixa etária dos mais de 55 anos, os homens ganharam, em 2020, em média mais 34% do que as mulheres enquanto em 2010 esta diferença foi de 46% (redução de 12 pontos percentuais);
  2. Na faixa etária dos 45 aos 54 anos, os homens ganharam, em 2020, em média mais 26% do que as mulheres enquanto em 2010 esta diferença foi de 39% (redução de 13 pontos percentuais);
  3. Na faixa etária dos 35 aos 44 anos, os homens ganharam, em 2020, em média mais 16% do que as mulheres enquanto em 2010 esta diferença foi de 24% (redução de 8 pontos percentuais);
  4. Na faixa etária dos 25 aos 34 anos, os homens ganharam, em 2020, em média mais 10% do que as mulheres enquanto em 2010 esta diferença foi de 11% (redução de 1 ponto percentual);
  5. Na faixa etária dos trabalhadores com menos de 24 anos, os homens ganharam, em 2020, em média mais 6% do que as mulheres enquanto em 2010 esta diferença foi de 8% (redução de 2 pontos percentuais);

QUAIS SÃO AS REGIÕES COM A MAIOR E MENOR DISPARIDADE SALARIAL ENTRE GÉNEROS?

As tendências da disparidade salarial entre géneros na última década em Portugal estendem-se a todas as regiões do país, sem exceção: os homens continuam a ganhar mais do que as mulheres, mas essa disparidade salarial tem vindo a decrescer em todas as regiões do país.

A disparidade salarial entre género era, em 2020, mais acentuada na Área Metropolitana de Lisboa e na região Centro, com os homens a ganharem cerca de 22% e 21% mais que as mulheres, respetivamente. No polo oposto estava a região do Algarve onde essa disparidade era de aproximadamente 10%.

Comparando a disparidade salarial entre 2010 e 2020, a redução da vantagem salarial dos homens face às mulheres foi mais significativa na Região Autónoma da Madeira e no Alentejo e mais contida nos Açores e na região Centro e Norte do país.

Face a 2019, o ganho salarial dos homens face às mulheres reduziu, em 2020, em todas as regiões do território português, com exceção dos Açores, onde aumentou de 14% para 17%.

Evolução da disparidade salarial entre homens e mulheres por região (NUTS-II) entre 2010 e 2020

FONTE: QUADROS DE PESSOAL (GEP/MTSSS), FJN/BRIGHTER FUTURE.2


O NÍVEL DE ESCOLARIDADE É UM FATOR IMPORTANTE NA DISPARIDADE SALARIAL

Dada a maior escolarização das mulheres, um dos aspetos mais relevantes a ter em conta na disparidade salarial entre géneros é comparar os salários de homens e mulheres com o mesmo nível de escolaridade. Essa análise não altera a principal conclusão: os homens continuam a ganhar mais do que as mulheres com a mesma escolaridade, qualquer que seja essa escolaridade. Em 2020:

  • entre os quem têm o ensino secundário, os homens ganharam mais 26% do que as mulheres;
  • entre os licenciados, os homens ganharam mais 36% do que as mulheres;
  • entre os mestres, os homens ganhavam mais 31% do que mulheres.

No entanto, a disparidade salarial tem vindo a diminuir de forma continuada ao longo da última década para o ensino secundário e licenciaturas. No caso dos mestrados, a disparidade salarial entre géneros em 2020 encontrava-se ainda num patamar semelhante ao de 2010.

No caso dos trabalhadores na faixa etária dos 25 aos 34 anos, a disparidade salarial foi menor para cada um dos níveis de escolaridade comparativamente à generalidade dos trabalhadores, mas ainda foi de 20%, 19% e 22% para quem detinha o ensino secundário, licenciatura ou mestrado, respetivamente.

Face a 2019, a disparidade salarial de género nos trabalhadores mais jovens reduziu, em 2020, para todos os níveis de escolaridade supramencionados. Analisando a evolução de 2010 em diante, a disparidade salarial na faixa etária 25-34 anos reduziu para o ensino secundário (de 25% para 20%), manteve-se praticamente inalterada entre os licenciados (19% em ambos os anos) e aumentou ligeiramente entre os mestres, passando de 19% em 2010 para 22% em 2020.

Evolução da disparidade salarial entre homens e mulheres por nível de escolaridade e faixa etária entre 2010 e 2020  

FONTE: QUADROS DE PESSOAL (GEP/MTSSS), FJN/BRIGHTER FUTURE.2

1SÃO CONSIDERADOS OS TRABALHADORES POR CONTA DE OUTREM EM EMPRESAS DO SETOR PRIVADO E DO SETOR EMPRESARIAL DO ESTADO. SALÁRIO BRUTO MENSAL MÉDIO A PREÇOS CONSTANTES (BASE 2020).
2RÁCIO ENTRE O SALÁRIO MÉDIO DOS HOMENS E MULHERES. SÃO CONSIDERADOS OS TRABALHADORES POR CONTA DE OUTREM EM EMPRESAS DO SETOR PRIVADO E DO SETOR EMPRESARIAL DO ESTADO. PREÇOS CONSTANTES (BASE 2020).

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